
Brasil registra aumento de 63% na produção de grãos em dez anos e estima safra recorde em 2025
novembro 5, 2025O milho, conhecido pelas etnias indígenas como “sustento da vida”, tem uma história milenar, com indícios de cultivo na América Latina há cerca de 5.000 anos, sendo um alimento central para povos como os guaranis. Por séculos, o cultivo se manteve de forma tradicional, mas, a partir da segunda metade do século XX, com a Revolução Verde e o avanço da industrialização, o milho se transformou, impulsionado pela introdução de híbridos, pela mecanização e pela pesquisa, que o consolidaram como um dos principais produtos do agronegócio global.
Diferente da soja, girassol e canola — que são oleaginosas, ou seja, possuem em sua composição um teor de óleo superior a 20% e são culturas plantadas primariamente para a extração de óleo —, o milho é considerado um cereal. Isso porque, na composição do milho, apenas o gérmen — que representa de 3% a 5% da totalidade do grão — armazena lipídios. Dito isso, o processamento do milho se centraliza em produtos como amido, proteína, milho flocado e álcool (etanol), entre outros. O óleo é apenas um resultado secundário e opcional de ser gerado ou não.
Tradicionalmente reconhecido por sua presença nas cozinhas e na composição de rações para nutrição animal, o óleo de milho está redefinindo seu papel no mercado. Historicamente obtido nas indústrias de amido, o produto ganhou novo impulso com a indústria de etanol, que alavancou a produção do óleo de milho técnico (TCO). Essa maior oferta agora assume um valor estratégico.
Em um cenário de busca crescente por fontes de energia renovável, o óleo de milho emerge como alternativa para a matriz de biocombustíveis, com aplicações que vão da produção de biodiesel e óleo vegetal hidrogenado (HVO) ao promissor Combustível Sustentável de Aviação (SAF). Essa transição do uso alimentar e nutricional para o energético não só otimiza uma cadeia produtiva já estabelecida, como também posiciona o milho como um ativo fundamental para a diversificação da matriz energética brasileira.
No Brasil, um dos maiores diferenciais do milho é sua flexibilidade agrícola. Diferente da soja, ele permite o cultivo de duas safras distintas no país, garantindo uma oferta mais estável ao longo do ano. Essa característica é crucial para a cadeia de produção de biodiesel, especialmente durante a entressafra da soja — um período crítico, geralmente entre agosto e setembro, quando o abastecimento pode se tornar escasso. Além da constância na oferta, o milho brasileiro oferece um portfólio versátil de óleos para uso energético, adaptável às necessidades da indústria. O óleo técnico (TCO), subproduto do etanol de milho, é o de maior volume e custo mais acessível, embora exija adaptação técnica das usinas devido à sua acidez mais elevada, que pode atingir até 15%. Porém, já existem produtores com capacidade própria de refino, entregando um óleo técnico de milho pré-tratado com acidez de até 1%. Já o óleo de milho bruto, proveniente das indústrias alimentícias, se destaca pelo equilíbrio entre qualidade e valor, podendo ser usado em misturas.
No âmbito internacional, é importante observar os principais fornecedores e compradores de milho, a fim de compreender desafios e oportunidades. Os três maiores produtores no ano comercial 2025/26 são, em ordem decrescente, Estados Unidos, China e Brasil. A produção norte-americana está projetada para uma safra recorde de 425,26 milhões de toneladas, enquanto a China deverá produzir 295 milhões de toneladas. O Brasil aparece em terceiro lugar, com produção estimada em 139 milhões de toneladas. Por consequência, esses países também se destacam como fontes de óleo para o mercado internacional, cada um com sua especificidade: o Brasil se sobressai no fornecimento de óleo de milho bruto (CCO) e TCO; os Estados Unidos exportam majoritariamente óleo degomado (CDCO) e TCO; já a China, com sua abundância de indústrias de refino, é fornecedora de óleo refinado (RBDW CO). Os principais mercados consumidores para a indústria alimentícia concentram-se no norte da África, Oriente Médio e Leste Asiático, em países como Arábia Saudita, Tunísia e Emirados Árabes Unidos, onde o óleo de milho é culturalmente comum para cocção. Já a Europa, usualmente, importa TCO para produção de biocombustíveis.
Precificação e Oportunidades
Assim como outros óleos vegetais, o preço do óleo de milho é influenciado por diversos fatores, incluindo a produção da safra, a disponibilidade de óleos substitutos e as tendências do mercado global. No Brasil, o óleo de soja serve como referência de precificação para o óleo de milho. Já no mercado internacional, o preço é mais frequentemente atrelado ao óleo de girassol, especialmente na indústria alimentícia.
No mercado de biocombustíveis, a precificação é ditada pelos feedstocks utilizados em cada região. Na Europa, por exemplo, o óleo de canola e matérias-primas de segunda geração — como o óleo de cozinha usado (UCO) e ácidos graxos — são os principais fatores que influenciam os preços. Em essência, a regra fundamental da oferta e demanda molda todos esses mercados.
O potencial do óleo de milho vai além das fronteiras brasileiras, impulsionado por uma reconfiguração da geopolítica energética global. Com a adoção de políticas protecionistas por grandes produtores, como os Estados Unidos, os fluxos comerciais tradicionais foram alterados. Isso levou mercados do Oriente Médio, Norte da África e Europa a buscar fontes alternativas de fornecimento. Nesse novo cenário, o Brasil — já um exportador estratégico — ganha ainda mais espaço e oportunidade de ampliar sua presença global, consolidando o óleo de milho como um item-chave em sua pauta de exportação.
Por: Leonardo Novais e Zainab Alhamwi, especialistas de óleo de milho da Aboissa Commodity Brokers




